sexta-feira, novembro 16, 2007

Não é nenhuma Brastemp não...

"Estou lavando roupa neste momento. Enquanto acompanho atráves da janelinha da máquina de lavar as minhas roupas remexendo de um lado para o outro em meio de água e sabão, compro um pacotinho de cookies e uma lata de coca-cola, naquelas máquininhas 'super-poderosas', onde você coloca algumas moedinhas e escolhe o biscoito e a bebida que você quiser.
Tem máquininha para comprar sabão também. E tem também a máquininha de trocar notas por moedas. Não para de entrar e sair gente da lavanderia. O lugar é grande, tem dezenas de máquinas de lavar de um lado, e outras dezenas de secar do outro lado. Ninguém fala com ninguém. As pessoas mal se olham.
Para passar tempo e quebrar o tédio escrevo essas linhas.
Lembro-me do último domingo que passei no Rio de janeiro. Passei o dia inteiro na praia de Ipanema. Sozinha. Bom, eu e a skoll. Caminhei até o Arpoador, apreciando o fim da tarde. Era um belo dia na Cidade Maravilhosa. Sol. Alegria. Início de verão. Linda paisagem.
Voltando para casa, peguei um ônibus até a Praça Mauá. O centro da Cidade estava deserto naquele dia. Ainda na Praça Mauá, sentei-me numa esquina, num meio-fio, enquanto esperava o ônibus para Nilópolis. E dali vi o lado feio do Rio. Vi a miséria. Vi a descompaixão. Vi o que ninguém vê. Ou melhor, vi o que todo mundo finge não ver.
Enquanto ainda morava no Rio, eu frequentava uma faculdade no centro da Cidade, e eu andava por aquelas ruas às 7h da manhã, às 2h da tarde, e muitas vezes às 10h da noite. Não importava a hora do dia, eu sempre cruzava com mendigos, crianças de rua, 'trombadinhas', que faziam-me apertar o passo e até mesmo atravessar a rua para trocar de calçada. A gente não olha, não encara. É bem mais fácil desvencilhar o caminho. Desviar a realidade.
Porém, naquela tarde de domingo eu não escapei da realidade. Era eu encarando a pobreza, encarando a miserável vida daquelas pessoas na minha frente. Bem ali na minha frente. Fiquei um bom tempo observando. Vi uma criança segurando um bebê que repetia a mesma coisa para todo mundo que passava perto "tia, tia, tem um trocado?". E ninguém ouvia. Ninguém via.
É muito mais conveniente ignorar do que pensar na profundeza do problema. É muito mais fácil desviar o caminho e pensar que você não tem nada haver com aquela situação. Afinal, você paga impostos e vota a cada eleição. Não é seu dever dar esmolas. Não é seu dever deitar a cabeça no travesseiro e pensar que tem milhares de pessoas lá fora passando fome, morando debaixo de pontes e viadutos. Pessoas essas, que têm como destino a criminalidade. A CRIMINALIDADE. Talvez, seja essa a única escolha que elas têm na vida. O que é certo e errado? Quem vai ensiná-las? A mãe que cresceu no mesmo meio? Ou o pai que segura um canivete para ganhar uns trocados?
Precisamos aprender o que é ser cidadão brasileiro. Não. Não estou falando em vestir a camisa verde e amarela, colocar a mão no peito e cantar o hino nacional de quatro em quatro anos."
* *
As fotos foram tiradas por mim. Naquele fim de tarde de domingo. As crianças as quais eu me referia estavam em uma outra esquina, há poucos metros de distância. E a mulher das fotos estava grávida.
Recomendação: ASSISTA o documentário do Ônibus 174!!!

quinta-feira, novembro 15, 2007

Mulheres.

Acabei de ler a última página do segundo livro de Khaled Hosseine. A Thousand Splendid Suns. O escritor de "O Caçador de Pipas" conseguiu, na minha opinião, se superar. O romance é bem previsível, mas a forma de como é contada a estória é intrigante. Eu vivi a cada página, o sofrimento, a dor, o drama da realidade das mulheres afegãs.
As condições de vida das mulheres no Brasil, há séculos e até poucas décadas atrás, também foram marcadas pela submissão, humilhação, desigualdade, injustiça e principalmente preconceito. Claro que num contexto diferente do Afeganistão, já que a política e religão têm inflência fortíssima.
Na década de 60 minha querida avó, com apenas 18 anos de idade, resolveu sair de casa para casar com meu avô (sem a permissão do meu bisavô). Meu bisavô era uma figura única, militar, durão, e mesmo sendo ela a filha querida dele ele berrou "Sua filha-da-puta, se você sair de casa você não vai colocar mais os pés aqui". E ela, talvez deslumbrada pelos 'anos dourados' deixou-se levar pelo romantismo da epóca. E casou-se com meu avô.
E pagou o Pão-que-o-Diabo-amassou.
Meu avô foi uma das piores pessoas que eu conheci. Complexo. Egoísta. Mesquinho. Transformou a vida de uma menina de 18 anos num verdadeiro inferno. Ciúmes, traições, surras, humilhação, desconfiança. Colocar fogo no berço com a minha mãe dentro foi uma das maldades que ele cometeu.
Acredito que minha avó separou-se após 5 ou 6 anos de casada. Com duas filhas no braço. Filhas que ele renegou. E saiu de casa. Sem ter um teto, sem ter um 'puto' no bolso. Óbvio que seu pai não a aceitaria de volta. Mesmo estando naquelas condições. Maus-tratos pelo marido. Na rua com duas crianças no colo.
Diante das circunstâncias, ela decidiu entregar as filhas à irmã do meu avó, sua cunhada. Um ato de desespero. De sobrevivência. E só Deus sabe o que minha mãe e minha tia passaram nas mãos dela. Enquanto isso, minha avó arranjou um emprego de manicure num salão qualquer, o que acabou tornando-se um lar provisório para ela. Por bondade dos donos, ela passou a dormir nos cantos do salão.
Ela me contava como era triste viver longe das meninas. Cada aniversário, cada Natal e Ano Novo sem estar perto, sem ter dinheiro para comprar um presente, uma roupa nova, sem ceia, sem árvore de natal, sem nada. E meu avó gastando dinheiro com outras mulheres.
Quando eu nasci ele tornou-se um pouco melhor. Primeira e única neta. Mas logo depois voltou a fazer as maldades dele. Lembro-me quando eu tinha apenas 4 anos de idade ele havia me dado de presente de aniversário um video cassete, e video cassete naquela epóca era A invenção. Tinha sido o melhor presente de todos os tempos, lembro perfeitamente. Lembro melhor ainda do dia em que tocou a campainha lá de casa e era um dos empregados dele pedindo o meu querido video cassete de volta. Foi um chororô que só vendo.
Não sei porque lembrei dessas estórias. Bobeiras que fazem parte do passado.
O que importa hoje é que eu e minha 'voreca' somos grandes amigas, uma relação muito maior do que apenas vó e neta. É a pessoa que eu mais admiro. A que mais me inspira. Minha referência. Minha vida!